quarta-feira, 27 de outubro de 2010

O VELHO E O RIO



Fausto não era um exímio pescador. Era apenas um teimoso à beira de um rio a enfrentar todos os percalços inerentes ao hobby por horas a fio sempre trocando histórias com outros pescadores e constantemente trocando de lugar por não ter paciência. Depois de margear o rio por umas duas horas encontrou um remanso que lhe pareceu, por intuição, ser um bom local para fisgar alguns peixes. Por mais que a paciência suportava, desestimulou-se e já estava a pique de juntar suas tralhas e voltar à cidade com a capanga vazia quando, onde o rio é encoberto pela vegetação que o margeiam na curva, viu surgir lentamente uma canoa. Alguém a remava cadenciada. Fausto até se esqueceu que estava para ir embora e ficou a observar atentamente a canoa se aproxima,lenta como as águas do rio, foram dez minutos de olhos fixos. Seu condutor, um velho que o tempo fez cansar, enrrugado até onde suas vestes deixavam ver, deixou os remos, dobrou as barras da calça deixando a mostra suas sandálias franciscana, agia como se por perto não houvesse ninguém. Fausto a pouca distância não lhe chamava a atenção, ou ele fingia não ver.
Depois saltou para a água que lhe dava pé naquela prainha que mais parecia um mar em calmaria. Depois de puxar a canoa até um areal fora d'água voltou, tocou a água como se a estivesse acariciando, passou as mãos úmidas de natureza pelo rosto, as águas sulcaram suas rugas e perderam-se na areia como se fossem lágrimas. Fausto continuava observando-o a certa distância até que notou que o velho começava a encaminhar-se para junto dele, aproximou-se:

- O senhor vai pescar aqui?
- Tem algum problema meu filho?- Perguntou o velho.
Não!É que aqui não tem peixe. Já faz quase duas horas que estou aqui e nada! Nem um peixinho.
Eu sei...




Se o senhor sabe, porque também veio tentar?
- Não é pelo peixe meu filho. Eu venho é espairecer as idéias.

Aqui no mato?
- Onde mais? Na cidade de onde vens?

Não sei... Talvez se aqui houvesse peixe seria mais animador. . . Eu não consegui nem uma tilápia.
- Se gosta do frigir, porque veio para a minha solidão? E quanto à tilápia pode desistir. Pesque o quanto quiser e não lhe virá nenhuma. Sabe porque? Este rio nunca teve tilápia. Já vi que você não conhece o rio. Veio da cidade achando que tudo é fácil, que é só chegar, iscar, lançar e puxar, pronto, eis um dourado de cinco quilos. Não é bem assim. Aqui não é um mercado. Vai muito além de nossa vontade. É para quem tem o saber da meditação, principalmente sem nenhum sapo por perto. O peixe sempre será uma mera conseqüência.
- Balela...
Não é balela meu filho... - Enquanto conversava o velho iscou o anzol, lançou a chumbada e espetou a vara no barranco. Depois começou fazer um cigarro de palha, com o pé direito deu um toque na vara. Seus olhos acompanhavam atentamente o movimento da linha. Quando viu que a ponta da vara arqueou, comentou para si:- Acho que pesquei um... Talvez um dourado. - Pos o cigarro já feito na orelha, deu uma cuspidela na palma da mão, a esfregou na outra, pegou a vara e como quem já sabia o que tinha,içou das águas turvas do rio um dourado de mais de cinco quilos. Fausto ficou boquiaberto e protestou:
- O senhor nem chegou direito e já pegou um peixão destes.
Eu tenho mais de quatro horas de picada de mosquito, tentei, tentei, e nada. Só estes dois piauzinhos.- Disse ao bater de leve na capanga pendurada no ombro.- Porque?
- Não sei! Talvez por eu ser um filho do rio, de suas margens. Mas a diferença que pesa é de como agimos em relação a esta natureza que nos cerca, a mata, o rio, os animais... Eu nunca os maltratei. Eu nunca os maltratei. Eu convivo correto com a natureza desde que me entendi por gente. Vocês eu não sei. Só sabem vir aqui para poluir tudo, olhe a sua volta, eu sei que você não esta pensando em levar este lixo que você produziu e nem sempre eu estarei aqui para condená-lo. Vocês só sabem destruir. O rio não tem como lhe retribuir e se sente angustiado de não poder devolver à sua casa o mesmo descaso, que vocês poderiam sentir só se os vissem amontoados em suas salas de estar. Pobre rio... Agora me dê a sua vara e observe. - O velho lança a chumbada no mesmo ponto do rio em que antes Fausto lançara, pouco depois, após um outro toque, a ponta da vara encurva e novamente com um pequeno esforço iça de dentro d'água, não um dourado, mas um surubim de mais de dez quilos. Fausto admirou-se e mais que abismado Voltou a protestar:
Eu andei conversando com diversos pescadores aqui da região e todos eles me disseram que neste rio não dá mais nada. Como o senhor me explica estes peixes que o senhor tirou d' água? ! -Você não notou nada?
-Não. O quê?!
-O toque que dou na vara...
-Mas isso qualquer um faz, até por acidente.
-Não meu filho!Só eu consigo avisar aos peixes que algum dia eu devolvi ao rio que voltei para buscá-los.
-Como?
-Eu nunca pesquei na desova, nunca usei explosivos ou redes e sempre devolvi os pequenos ao seu berçário. Nós temos que ter conhecimento que se não preservarmos o rio. Adeus...
Fausto ficou pensativo... Enquanto isto o velho enrolou sua linha, guardou os seus anzóis cuidadosamente e embarcou, remando como veio e sumiu na curva do rio sem dizer mais uma única palavra. Fausto ficou ali, estático ao ver sumir"O VELHO DO RIO."

Marcondes Filho

2 comentários:

  1. Bacana você fazer isso para seu pai.


    Prazer te conhecer.

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  2. Oi Jaque!! Vi sua mensagem lá na comu do orkut q segue quem te seguir rs, tenho dois blogs o http://mulherdfases.blogspot.com/ e o http://maniadebonjovi.blogspot.com/ obrigada!! Ahh!! e amei seu blog super criativo bjsss

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